Como se ama o silêncio, a luz, o aroma,
O orvalho numa flor, nos céus a estrela,
No largo mar a sombra de uma vela,
Que lá no extremo do horizonte aponta;
Como se ama o clarão da branca lua,
Da noite a mudez os sons da flauta,
As canções saudosíssimas do nauta,
Quando em mole vai e vem a nau flutua;
Como se ama das aves o gemido,
Da noite as sombras e do dia as cores,
Um céu com luzes, um jardim com flores,
Um canto quase em lágrimas sumido;
Como se ama o crepúsculo da aurora,
O manso vento que nos bosques rondeia,
O sussurro da fonte que passeia,
Uma imagem risonha e sedutora;
Como se ama o calor e a luz querida,
A harmonia, o frescor, os sons, os céus,
Silêncios e cores, perfumes e vida,
Os pais e a pátria e a virtude e a Deus.
Assim eu te amo, assim; mais do que podem
Dizer-te os lábio meus, - mais do que vale
Cantar a voz do trovador cansada:
O que é belo, o que é justo, santo e grande
Amo em tí. - Por tudo quanto sofro,
Por quando já sofri, por quanto ainda
Me resta sofrer, por tudo eu te amo!
(Gonçalves Dias)